Tigre da Tasmânia

«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector

sexta-feira, março 31

Decepção de uma geração

Vivemos numa geração, numa época, numa era em que os jovens que não toleram mau ambiente nos empregos, que não embarcam em esquemas, que se deixam pisar e que abafam as suas opiniões e formas de ser e de estar são vistos como cobardes, inadaptados, fracos e inúteis.

Viver para perceber

«A vida não é a que cada um viveu, mas a que recorda e como a recorda para contá-la».

Assim é a casa de partida de «Viver para contá-la», de Gabriel García Marquez.

Mas por muito que nos conte não vamos compreender. É preciso viver para perceber, porque viver através da experiência dos outros, por meio das palavras que os outros nos contam, não atinge um ínfima parte do que é a Vida.

quarta-feira, março 29

x e y

«– Ficas muito chateado se eu não for?
– Não. Se formos a ver também nunca vens a qualquer das coisas para as quais te convido...
– Aí vem a birra... Vá, enumera quantos convites teus eu recusei?»

Conversa cada vez mais banal entre amigos, namorados, familiares... A questão não está em saber quantos convites é que x recusou a y, mas sim em tentar perceber a razão pela qual y sente que x nunca o acompanha. Até onde vamos quando tentamos a todo o custo mostrar e provar que nós é que temos razão, e quando é que vamos parar e tentar perceber as razões que levam à tristeza e desconforto do outro?

Ser

«Ninguém sabe o que é
Ser um verbo de existir
É procurar-se sem encontrar fim.
Quem é não é, é será
Esboços de Ser sem nunca o ter sido...
Nem fui é.
Será»

RV

sábado, março 25

Explorar a pé

Está finalmente a chegar o bom tempo, que me permite aventuras a pé por todo o lado. Pelas ruas perdidas de Lisboa. Pelas praias. Pelos montes. Pelas serras. Descobrir rios subterrâneos. Descobrir grutas. Descobrir quedas d'água. Sentir o mesmo, com as devidas proporções, que Cristovão Colombo sentiu quando chegou a terras de Vera Cruz.

Bom ouvinte

Há noites em que gosto de passar horas e horas a ouvir os outros conversar, falar, argumentar, discutir... Ser um bom ouvinte, observar, reflectir e meditar. Para mudar as noites em que falamos, falamos e falamos.

quinta-feira, março 23

Manias

Parece que também eu vou entrar nesta festa...

Regras: «Cada bloguista participante tem de elencar cinco manias suas, hábitos muito pessoais que os diferenciem do comum dos mortais. E além de dar ao público conhecimento dessas particularidades, tem de escolher cinco outros bloguistas para entrarem, igualmente, no jogo, não se esquecendo de deixar nos respectivos blogues aviso do "recrutamento". Ademais, cada participante deve reproduzir este "regulamento" no seu blogue.»

Manias...Será que eu tenho manias? Ou tenho «a» mania?

Andei a pensar nisso mas não foi fácil. Andei a observar-me e cheguei a algumas, pequenas, conclusões. Ora vamos lá.

Gosto de tirar os sapatos sempre que posso. No cinema, no escritório, na redacção, qualquer abébia e lá estou eu de pés de fora.

Tenho a mania (ou o karma…) de chorar em quase todos os filmes. É quase fatal como o destino. De alegria, de tristeza, por identificação, por admiração de actos heróicos ou de coragem, enfim… Entro mesmo no contrato cinematográfico e lá está.

Tiro SEMPRE os óculos quando atendo o telefone. Óculos de ver ou de sol, lá saltam eles quando o aparelho apita. E depois coloco-os no primeiro sítio que encontro, e já me aconteceu que fosse no frigorífico...

No ténis, quando falho o primeiro serviço, vou automaticamente para o segundo. Não espero uns segundos para me acalmar, reflectir ou preparar o segundo serviço. É mania.

Tenho a mania de descodificar as matrículas dos carros: UO, unidentified object, OE, orçamento de Estado, IP, itinerário principal... Enfim, esta não é mania, é mesmo parvoíce.Vendo bem... que manias aborrecidas eu tenho.

E a seta está agora apontada a...

Lu - oquetequero.blogspot.com
Hugo - situationsheavy.blogspot.com
Vanda - bracosdapaz.blogspot.com
Andreia - lalunalunera.blogspot.com
João - magacine.blogspot.com

quarta-feira, março 22

Chronos vs Tempus

Existem dois tempos na essência do nosso ser. Um é o tempo físico, o outro o tempo psicológico.

O tempo físico é aquele que é controlado pelos ponteiros do relógio. É contabilizável em segundos, minutos, horas, dias, meses, anos, séculos e milénios. O tempo físico é estanque, começou aqui e acabou ali, sendo igual para ti e para mim, aqui ou na China.

Já o tempo psicológico é multifacetado, mutante, sempre distinto. Uma pessoa com a qual convivemos durante uns minutos pode ser mais marcante e representar muito mais que alguém que conhecemos desde sempre, durante os tais segundos, minutos, dias, meses e anos. A intensidade do tempo psicológico não é mensurável. Um dia de loucura tem mais peso que todo um mês mecânico, um momento de celebração é incomparável perante anos de sombra.

segunda-feira, março 20

24 on 24

Um pensamento estranho assola-me quase todos os dias, normalmente naquele pedaço de tempo em que, já de cabeça na almofada, fazemos uma curta-metragem do dia que passou. No escuro vou avançando. São rostos iluminados por focos de luz apontados de baixo para cima. Mostram-me faces familiares, que conforme as suas expressões, alegres ou tristes, contentes ou zangadas, dão o seu aval sobre as últimas 24 horas.

A varanda do Lux

A varanda do Lux deve ser o melhor sítio de meditação de Lisboa à noite, quando nos sentamos naqueles sofás de plástico bem confortáveis e olhamos lá ao fundo as luzes na outra margem do rio. Em segundo plano, bem camuflado porque a mente voa mais alto, estão os sons que lá dentro animam os noctívagos.

Barulhinho bom

Há muito tempo que não ouço o tradicional som da guitarra de beiças dos amoladores de tesouras. Estarão extintos?

Vai dar entrada na linha número um o comboio regional...

Durante o fim-de-semana estive tão distraído que foi como se estivesse numa estação ferroviária e os comboios não parassem...

segunda-feira, março 13

O búzio

O búzio nasceu lá no fundo bem fundo da buraco mais fundo do oceano. Como estava muito escondido naquele poço de mar gigantesco, o búzio demorou muito tempo a chegar à superfície. Durantes dias e dias a fio o búzio subiu, subiu, subiu, por entre a escuridão daquele buraco fundo. Mas quando finalmente emergiu, depois da terra ter dado várias voltas ao sol, o búzio viu o sol magnífico brilhar, primeiro por entre as últimas camadas de água, que coavam a luz, depois sem quaisquer barreiras. E sentiu o calor dos raios a beijarem-lhe a casca. Para todos os lados para onde olhasse, norte, sul, este e oeste, o búzio apenas via azul, o azul do oceano, aqui e ali pintalgado pelo branco da espuma. Lá ao fundo, baleias e golfinhos brincavam e saltavam, viajando livres e sem destino.

Por dias e noites de luar o búzio percorreu o gigantesco mar, em busca não sabia muito bem do quê. Passou pelo Hawai e viu os surfistas na crista da onda, andou ao largo da California e deliciou-se com as palmeiras, desceu à costa do Chile, dominada pelo manto branco e misterioso dos Andes; na Patagónia conheceu a Terra do Fogo e os velhos barcos de madeira que faziam a ligação entres as casas de água, rumou a norte e atravessou o Atlântico. Em S. Tomé encantou-se com o cheirinho do café que dominava a ilha e em Cabo Verde perdeu-se nas praias sem fim. Resolveu voltar atrás e, com muita força e rapidez, sem olhar ao Bojador ou à Boa Esperança, chegou a Moçambique, à mais bela areia branca do mundo. Aí deitou-se nas dunas e adormeceu. Depois do descanso, o búzio continuou a sua aventura. Subiu por África até Ormuz. Se o mundo fosse um anel, diziam os árabes, Ormuz seria a sua pedra preciosa. Entrou pelo Golfo Pérsico, passou pelo Canal do Suez e chegou ao Mediterrâneo. Chipre, Creta, Malta, Sicília, Baleares, Lisboa.

O búzio está agora aqui ao meu lado, como memórias de um belo dia de praia.

quarta-feira, março 8

O Eu de um Homem

«Num certo sentido, o eu de um homem é a soma de tudo aquilo a que se pode chamar seu, o seu corpo e as manifestações dele, os pertences, as roupas, as casas, os filhos, os livros, a reputação, as terras, as emoções, e Timóteo guardava de outra vida apenas a sua representação. Lá no fundo, esconjurara a sociedade quando tivera a percepção do fracasso de uma cultura assente no culto da individualidade, no interesse pequenino elevado à condição de virtude moral no paraíso secular do êxito e da fama. Ao contrário de outras fantasias e ilusões, prosseguira consequente e inabalável nesse desiderato de viver à margem, mau grado as recriminações e ameaças dos irmãos.»

Serviço de Urgência, Justino Perestrelo

Coisa Ruim

«O maior truque do Diabo é convencer-nos que não existe.»

Coisa Ruim, Rodrigo Guedes de Carvalho

terça-feira, março 7

Faster, faster

Por vezes penso que as vias-rápidas de Lisboa são artérias e veias, sendo as ruas, avenidas, travessas e becos vasos capilares do corpo principal que é a capital do país. São autênticas corridas de Fórmula 1 que todos os dias decorrem no Eixo Norte-Sul, Avenida Lusíada, Avenida Infante D. Henrique, Avenida 24 de Julho, Avenida da República, 2ª Circular e tantas, tantas outras. E por momentos sou o piloto de F1 que sempre sonhei ser.

Copos do Gaudí

Lembro-me de quando estive em trabalho no Fórum das Culturas 2004 em Barcelona da elevada consciência ecológica que se vivia no evento. Uma dos pequenos (grandes) pormenores eram as bebidas servidas nos vários quiosques espalhados pelo recinto. Eram servidas em copos de plástico, custando cada um cinquenta cêntimos. Não eram copos quaisquer. Eram estilizados, elaborados por um designer, inspirados nas curvas de Gaudí. Melhor que tudo, eram reutilizáveis. O cliente podia optar por guardar o copo e entregá-lo a cada nova bebida. Assim, não se gastava plástico indiscriminadamente. Cada um, ajudado pelo facto de ter gasto uma quantia simbólica num copo, ganhava assim um pouco de consciência ambiental. Uma boa ideia para eventos, para discotecas e outros acontecimentos onde o desperdício de plástico é um crime.

O Outão

Vai voltar a co-incineração. Os estudos estão feitos, mais que feitos, e as conclusões são as mesmas: Souselas e Outão. Pegando mas palavras de Miguel Sousa Tavares, qual a razão pela qual, em Portugal, quando os estudos técnicos não resultam nas conclusões que eram esperadas/desejadas, já não são válidos? Por alguma razão são estudos técnicos, elaborados por profissionais que sabem muito mais que o cidadão médio. Se não lhes fosse dado qualquer crédito, aos técnicos entenda-se, qualquer um de nós poderia fazer um estudo sobre o melhor local para a co-incineração, a melhor localização do novo aeroporto de Lisboa ou o melhor traçado para o TGV…

Levanta-se no entanto outra questão: o Outão. O erro do Outão prende-se com o facto de termos uma cimenteira em pelo Parque Natural da Arrábida, que esventra a serra e destrói aquele património natural, e não no facto de aí podermos proceder à co-incineração. Por isso, em vez de se lutar contra a co-incineração, lute-se contra o crime ecológico que há décadas envenena a serra.

sexta-feira, março 3

Será que já ninguém se lembra?

Fui ver «Mrs Henderson presents» ao cinema. Judi Dench está, como sempre, excepcional, com a sua pronúncia extremamente britânica numa personagem carregada de humor refinadíssimo. Mas o mais impressionante do filme são as memórias da II Grande Guerra Mundial, que assola o filme na parte final. Mais uma vez nos apercebemos como a guerra é estúpida, apenas isso, estúpida.

Como é possível então sequer aplaudir a personagem Bush pelas suas manobras no Afeganistão e Iraque? Como é possível concordar com Blair? Como foi possível entender Aznar?

Isto do lado ocidental do globo. As posições de Bin Laden e companhia não são menos desculpáveis. Qualquer guerra ou uso de bombas e material de destruição é intolerável. Quando vamos parar de novo para perceber isso? A II Grande Guerra foi há menos de 70 anos… Será que já ninguém se lembra?

quinta-feira, março 2

O trabalho

Nesta vida existem três considerações fundamentais na relação de trabalho: i) respeito, incentivo e motivação para o trabalho da parte do chefe e do chefiado; ii) o chefe ser capaz de impor respeito e admiração ao chefiado e iii) o chefiado gostar do que faz e ter o mesmo respeito e admiração pelo chefe.

O Processo de Bolonha

Ontem ouvi na rádio que os estudantes da Universidade de Coimbra organizaram uma manifestação contra o Processo de Bolonha, caricaturizando o Reitor e o Ministro do Ensino Superior, Mariano Gago.

Dizem eles que o acesso à Universidade vai sair ainda mais caro e que este processo fecha as portas aos estudantes. Será que estes meninos sabem do que se trata este documento? Saberão porventura que pretende equiparar o ensino superior português ao europeu? Saberão que em vez de quatro ou cinco anos de licenciatura mais dois de mestrado poderão ter estas qualificações em quatro anos?

Ou será que estão ocupados a beber uns copos e a passar dez anos arrastados a tirarem um curso e a fazerem manifestações por tudo e por nada porque «é giro»?