Tigre da Tasmânia

«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector

terça-feira, junho 26

As colinas da mente

Nada melhor para esclarecer as dúvidas e arrumar as questões, colocar os argumentos em cada canto e empurrar os problemas para cada prateleira do que andar a pé por Lisboa. Colina acima, colina abaixo, entra no eléctrico e sai do eléctrico, sem qualquer limite de tempo, compromisso ou alguém à nossa espera. A cabeça chocalha e as ideias vão parar ao sítio certo.

domingo, junho 24

Étecétera

Manias. Todos temos manias, coisas que fazemos constantemente, muitas sem nos darmos conta, que já fazem parte de nós e nos definem como ser. Sempre que posso, e mesmo quando não posso, descalço-me. No ténis, sempre que uma pancada sai mal, faço questão em repeti-la. Gosto de andar sempre no meio da rua, mesmo quando os passeios estão livres. Quando em conversa foco sempre o olho direito da pessoa. A seguir ao almoço bebo uma meia de leite. Étecétera. São os nossos pontos cardeais, Norte, Sul, Este, Oeste.

quarta-feira, junho 20

Santeando

Manjerico de Santo António

Há alegria aos montões
Estalam foguetes no ar
Eu fui colher este cravo
Para nesta noite te ofertar

Manjerico de São João

Oferecer um manjerico
É uma velha tradição
Eu vou-te oferecer um
Nesta noite de São João

segunda-feira, junho 18

"Good Riddance (Time Of Your Life)"

Another turning point, a fork stuck in the road
Time grabs you by the wrist, directs you where to go
So make the best of this test, and don't ask why
It's not a question, but a lesson learned in time

It's something unpredictable, but in the end it's right.
I hope you had the time of your life.

So take the photographs, and still frames in your mind
Hang it on a shelf in good health and good time
Tattoos of memories and dead skin on trial
For what it's worth it was worth all the while

It's something unpredictable, but in the end it's right.
I hope you had the time of your life.

It's something unpredictable, but in the end it's right.
I hope you had the time of your life.

It's something unpredictable, but in the end it's right.
I hope you had the time of your life.

domingo, junho 17

Passaporte

Está a chegar o Verão e a altura em que todos pensam nas férias e nas viagens de sonhos. Férias para já nem vê-las. E viagens, só mesmo nos sonhos. Um dia hei-de fazer a estrada pan-americana, da ponta sul da América até ao norte do continente. Hei-de ir a São Tomé e Príncipe, descrito como um dos mais belos países do mundo. Hei-de mergulhar pela Grande Baía de Coral na Austrália. Hei-de percorrer a América Latina de mota como o Che. Hei-de viajar no Comboio Transiberiano, até Vladivostok. Hei-de mergulhar nas águas da Ilha de Moçambique. Hei-de passear pela Praça Vermelha em Moscovo. Hei-de fazer um retiro em Samoa, no meio do Pacífico. E se tiver tempo ainda vou passar uns dias à Lua.

sábado, junho 16

ER Car

O meu carro, companheiro de guerra e aventuras, que eu tão maltrato com estradas esburacadas, com muito pó, inclinações, ruas estreitas e passagens impossíveis, está há mais de dois meses no estaleiro. Tomei coragem e no outro dia lá fui, como se fosse visitar alguém ao hospital. Estava lá ao fundo da oficina, motor aberto, todo esventrado, fios por todo o lado, como um paciente numa cama ligado à máquina. Fiquei triste e custou-me ver o meu parceiro de viagens neste estado. Disseram-me que dentros de dias já podia ir buscá-lo. Vamos lá ver quando tem alta…

sexta-feira, junho 15

Santo António da Estrela

Infelizmente já passou a noite de Santo António. A noite favorita de um lisboeta como eu já lá vai e começo a contar os dias para a próxima. Saímos todos à rua, gingões, felizes por tudo e por nada, a rir e a cantar, a mexer o pézinho e a bailar ao som das marchas. Até o cheiro a sardinhas e pimentos entranhados na roupa e nos cabelos é bom. Lisboa é linda, ainda mais nos Santos Populares.

terça-feira, junho 5

«Se eu soubesse que voando...»

Se eu soubesse que voando
Ai, alcançava o que desejo
Mandava fazer umas asas
Ai, que as penas são de sobejo

As penas leva-as o vento
Ai, de tão leves que elas são
Ainda me não levou uma
Ai, que trago em meu coração

Cantando, cantei, cantava
Cantava, cantei, cantando
Chorando, chorei, chorava
Chorava, chorei, chorando

Que fui, tu foste, nós fomos
Ambos iguais nas vontades
Eu 'stou tu 'stás, nós estamos
Ambos matando saudades

Esses olhos têm meninas
Ai, essas meninas têm olhos
Porque os olhos dessas meninas
Ai, são meninas dos meus olhos

Fui ao jardim do teu peito
Ai, para colher uma flor
Não achei um amor perfeito
Ai, achei só perfeito amor

Cantando, cantei, cantava
Cantava, cantei, cantando
Chorando, chorei, chorava
Chorava, chorei, chorando

Que fui, tu foste, nós fomos
Ambos iguais nas vontades
Eu 'stou tu 'stás, nós estamos
Ambos matando saudades

Gaiteiros de Lisboa

sábado, junho 2

Pintas brilhantes a latejar

O miradouro do jardim está ali escondido e quase ninguém dá por ele. Quem lá vai é porque conhece. Ninguém vai ao engano. Dali avisto uma nesga de rio, as copas das árvores frondosas, o recorte dos prédios do largo grande lá ao fundo. A serra no horizonte e as casas antigas juntam-se ao grupo, com banda sonora dos sinos da igreja e dos corvos lá em baixo. É mais um dos locais secretos e sagrados que todos nós temos e guardamos. Onde nos dirigimos quando nos sentimos perdidos, sem orientação ou quando queremos recuperar bons momentos ou ainda inspiração para os passos que se seguem. Porque o tempo não pode parar. Mesmo que o desejemos com muito força, cerremos os olhos até doer e fechemos os punhos até rebentar.

sexta-feira, junho 1

O ar da noite

Na semana passada a caminho de casa sentei-me num banco de jardim. Não mais queria sair dali. Não queria que o ar sentisse que me estava a mover, não queria que ninguém me visse mais. Só. Quedo. Queria ali ficar.

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Sentado no muro frio de betão, os prédios pombalinos como vizinhos, o palácio cor-de-rosa lá ao fundo, o céu negro pintalgado de estrelas. Senti-me pequeno, insignificante, desprotegido, exposto. O dia correra estranho, a noite não melhor depois do filme que me colocou em causa. Meditei. Reflecti. Afastei aqueles que me tentavam falar. E corri para casa.