Tigre da Tasmânia

«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector

quarta-feira, janeiro 25

Como vivemos hoje?

Ontem houve um senhor que resolveu que queria saltar da ponte em plena hora de ponta. A ligação a Lisboa esteve fechada três horas e os acidentes que se lhe sucederam foram mais que muitos. Conclusão: calvário para chegar a casa. Para onde quer que os virássemos eram filas e filas intermináveis. Tentar seguir pela ponte Vasco da Gama, como os inocentes locutores da rádio sugeriram? Mas como lá chegar? É fácil propor a solução, mais difícil é como chegar a ela…

O ponto da questão centra-se no entanto no desespero deste homem. Não sei quem é, o que faz, o que o levou a tentar saltar, quem é a sua família, se a tem, quem são os seus amigos, se algum houver. Mas o que sobretudo não sei é o que leva alguém a criar este circo para chamar a atenção e assim transtornar a vida de muitos. Estaremos numa sociedade tão despedaçada de valores que é preciso um homem fazer um disparate destes para que lhe dêem atenção?

Libertação

A água desce com pressão, quente, bem quente, provoca fumo e uma sensação de sublime. No duche libertamos os pensamentos e exalamos a nossa mente para outro mundo melhor.

Vida de cão

Quando chego ao meu local de trabalho costumo ficar, por momentos, a observar os cães que tranquilamente estão deitados na relva e que absorvem douradamente os raios de sol. Vida de cão…

terça-feira, janeiro 24

...

Por vezes parece que o melhor que temos a fazer é ficar quietos no nosso canto, não fazer alarido e deixar a tempestade passar e a poeira assentar. É melhor ficarmos ocultos na sombra enquanto de noite a cavalaria dos fantasmas atravessa os corredores, passa ao lado do nosso quarto e rasa a nossa porta.

Falar, fazer, agir, mostrar, parece apenas piorar as coisas, como um trapalhão descoordenado que numa loja de cristais tenta passar incólume e despercebido.

Por vezes é melhor fechar a concha e só abri-la quando as condições estiverem de novo normais.

Remar sozinho contra a maré pode parecer glorioso, desde que minimamente realista. Há que saber dar o salto na altura certa.

Até já.

Portugal Menor

José Gil: "Es un fenómeno casi religioso"

"CAVACO ES UN CASO extraordinario, como síntoma, de la irracionalidad que ha invadido a la sociedad portuguesa", afirma el filósofo José Gil. "Sin necesidad de hablar, sólo con su presencia, como si fuera un santo, las multitudes rugen ante él como si aquello fuera una procesión en rogativa o una concentración de comunistas". "Se trata de un fenómeno casi religioso", añade el autor del ensayo y éxito de ventas Portugal hoy: el miedo a existir. "Es un fenómeno irracional de masas que crea un populismo sin discurso. Como si fuera un mesías laico, Cavaco ha convencido al pueblo de que el milagro es posible".

¿Milagro? ¿Pero qué milagro? "El milagro de salir de este horrible lío en que estamos metidos sin que nada cambie, sin que hagamos sacrificios, sin que nos cueste esfuerzo, sin perder los privilegios que muchos tienen", responde Gil. El análisis del profesor de Filosofía de la Universidad de Lisboa, de 65 años, va un poco más lejos: "Estas elecciones son como una partida de ajedrez viciada antes de empezar. Ni las blancas son blancas ni las negras son negras, la reina se mueve como un alfil y los peones como una torre. Los candidatos de izquierda son el pasado; Cavaco es una gran masa de pasado. No hay una sola idea nueva para afrontar el futuro, sólo discusiones bizantinas. De lo que se deduce que el pueblo portugués ama la obstinación que no tiene y el autoritarismo. Porque Cavaco es eso: un jefe sin carisma, una persona encerrada en sí misma, que manda y sabe dónde va".

Me, Myself and I

Me, Myself and I

I try to kill those ghosts inside of me
That voice you've spoke is yelling in my ears
(And I don't believe in love fools)
I'd like to have those eyes you want to kiss
I wish I had that voice you want to ear
(And I don't believe in love fools)
This feeling is so hard that I can't speak
I wish you touch my hair when I'm asleep
(And I don't believe in love fools)
The words you wrote are putting me away
I know that love was for somebody else
You and I know
You and I tried
You and I ran
Leaving old stories far behind
And it feels good
And it's so warm
Having those eyes
Playing with me, myself and I

The Gift

domingo, janeiro 22

A estupidez

Fez-me impressão ver o JarHead - Máquina Zero, a última aventura cinematográfica de Sam Mendes. O filme não tem sido muito recebido pela crítica, mas isto de críticos por vezes não se deve dar muito crédito.

Mais impressionante que a crueldade da vida de militar, da dureza dos treinos e do exercício físico, da total falta de condições e da dimensão humana tornada em máquina de puxar o gatilho, mais impressionante que a guerra que nunca mais começa e que nos envolve num clima agonizante de suspense e de «quase», mais impressionante que tudo isso é o quão baixo o Homem pode descer.

Dois soldados terminam o filme em luta desenfreada pelo privilégio de matar, pela glória de atingir alguém e determinar o seu fim. O auge, o êxtase, o orgasmo de um soldado é causar a morte, espalhar sangue e rebentar miolos. Quem foi que disse que a guerra não é estúpida, idiota, cretina e novamente ainda mais estúpida e idiota?

Massacre no cinema

Estive a passar os olhos pela crítica de cinema do Expresso desta semana. Parece que mais importante que ter o olho cinematográfico treinado e bem regulado é saber como destruir e dizer mal. Máquina Zero, Noiva Cadáver do magnífico Tim Burton, Odete, S.A.W 2 e até em parte Match Point do aparentemente inatacável Woody Allen, todos os filmes são massacrados.

Estará o cinema que é transmitido em Portugal em tão mau estado e baixo nível, ou estarão estes senhores mal-dispostos e com azia?

O frio faz as malas

A luz espreita de novo pela fresta da janela. O sol parece querer dizer que o pior já passou, o frio está de novo a começar a fazer as malas para voltar para o ano. A porta da varanda aberta é sinal que os tempos estão de novo a mudar. O ritual retoma-se, o frio enfraquece e prepara a despedida, o calor já pensa em voltar para onde nunca devia sair.

Os sinos da Estrela

Desde pequeno, quase desde que nasci, que vivo ao pé da majestosa Basílica da Estrela. Gosto de ficar a ouvir os sinos a tocar, a marcar a hora, a chamar os fiéis para a missa, a comemorar um casamento, a celebrar um baptizado ou a lamentar uma morte.

No ano passado os sinos regressaram ao templo, depois de uma operação de restauração mediática, e voltaram do imaginário que se pensava perdido mas que apenas estava esquecido no baú da memória.

Os sinos marcam de novo a hora, são parte de quem vive neste bairro, batem o compasso da vida em redor.

Rapsódio de cores ao Domingo

É Domingo e pela primeira vez desde há uns tempos levantei-me antes do meio-dia... Sabe bem esta sensação de que o dia não começa quando já está quase a anoitecer.

E para comemorar nada melhor que um mega pequeno-almoço, uma rapsódia de cores e sabores a colorir o tabuleiro, o cor-de-laranja do sumo, o castanho do capuccino, o amarelo do croissant com manteiga, o rosa do doce de framboesa no pão, o branco do iogurte. Tudo na cama gigantesca salpicada pelo sol que espreita no seu esplendor pela fresta da porta da varanda.

quinta-feira, janeiro 19

Esperar no escuro

Depois de terminar o filme ele permanece na sala. Perante os seus olhos, a ritmo lento, a ficha técnica percorre o seu caminho. Aos nomes das estrelas do filme seguem-se realizadores, produtores, sonoplastas, aderecistas, maquilhadores, câmeras, cabeleireiros, caracterizadores, e muitos, muitos mais, todos aqueles que ajudaram a obra a nascer. Por entre esse emaranhado de letras por vezes surgem nomes e sons familiares. São os portugueses que tentaram a sua sorte em Hollywood e as outras mecas do cinema.

Estes minutos a seguir ao fim do filme, quando as letrinhas brancas salpicam o fundo negro, servem muitas vezes de ressaca ao que se acabou de ver. É uma espécie de catarse dos tempos modernos, de análise ao comportamento das personagens, de apreciação ao argumento, de compreensão (ou não) do guião, enfim, é quando se decide: «sim, gostei do filme; não, não gostei do filme».

A ficha técnica também faz parte do filme, por vezes contém imagens surpresa que estão guardadas apenas para aqueles que sabem esperar, mas é sobretudo um aplauso e uma homenagem a todos os que contribuíram para que filme tomasse forma.

segunda-feira, janeiro 16

Pensamento da semana

«O trabalho liberta o Homem», já dizia Marx.

O Marx era um brincalhão...

O topo dos edifícios

Reparei no outro dia que quando vou pela cidade, de carro ou a pé, não olho para o céu nem para o topo dos edifícios. Se calhar é para não ir contra os postes, como no outro dia quando me ria às gargalhadas e nem olhava por onde andava…

Vou muito concentrado a olhar em frente, a reflectir, a planificar o que vou fazer, a meditar sobre o que se passou, sobre o que me disseram ou sobre como reagiram perante determinada situação.

Ou então vou a olhar para as pessoas que passam. Gosto de observar, de analisar, de fazer cenários sobre o que os outros andam a pensar. Porque estão tão apressados? Porque estão com aquela expressão perdida? Para onde vão tão arranjados?

E não olho para cima. Mas uma rápida mirada permite perceber que os nossos prédios estão velhos, sujos, esquecidos e ignorados por quem de direito. É uma pena olhar para os prédios de Lisboa e ver fachadas encardidas, escuras e sombrias. Andares vazios, janelas escancaradas para o nada, vidros partidos. Põe-nos mais tristes e macambúzios, fechados connosco mesmo.

Venham os prédios amarelos, cor-de-rosa, azuis, as cores pombalinas com que o Marquês deu nova vida à cidade depois do terramoto. E venha também a já muito falada candidatura da capital a património mundial da Unesco. Mas para isso é preciso arrumar bem a casa primeiro.

quarta-feira, janeiro 11

Continuamos na monarquia?

Começou finalmente a campanha para as presidenciais (embora tenhamos tido uma pré-campanha tão preenchida que nem demos pela transição; depois do silêncio perturbador até ao início do Verão, os últimos meses têm sido inundados por estas eleições). Os candidatos estão na rua, o circo oficialmente começou.

Vamos por partes:

Cavaco Silva caminha rumo à entronização, quem sabe logo à primeira volta, por KO técnico. Confesso que não compreendo esta adoração maciça e esmagadora ao candidato da direita, aquele que saiu do Governo em 1995 com uma imagem negra, aquele que perdeu frente a Jorge Sampaio, aquele a quem nunca foi reconhecido carisma nem uma aura de atracção. Os portugueses (pelo menos quase 60 por cento, segundo indicam as mais recentes sondagens) parecem ansiar por um salvador, um D. Sebastião, alguém que tenha a fórmula mágica para tirar o país da crise e colocá-lo na rota europeia dos mais ricos e desenvolvidos.

A maioria acredita que essa figura messiânica é Cavaco, aquele que como primeiro-ministro, com os fundos europeus a chegarem que nem ondas numa praia, garantiu auto-estradas para toda a gente, saneamento básico, betão e mais betão, enfim, aquele que disfarçou um pouco o país que era rural no seu todo e que agora o é um pouco menos.

A maioria acredita que é Cavaco, aquele que conseguiu saltos visíveis no PIB e no crescimento económico nacional, aquele que nunca se enganava e raramente tinha dúvidas, aquele que desprezava os jornalistas (e dispensava apenas cinco minutos diários aos jornais).

Pegando neste último ponto, como pode alguém ambicionar ser o representante de Portugal no mundo se aparenta um ódio e um desdém quase visceral à informação, ao estado actual do país e do mundo? Como pretende esse alguém estar informado? Como pretende esse alguém estar no Eliseu e falar com Chirac sobre o problema dos subúrbios das grandes cidades francesas, estar na Casa Branca e discutir o que se passa no Iraque, estar em Downing Street e perceber a diversidade da sociedade britânica?

Outro ponto prende-se com as verdadeiras intenções de Cavaco Silva. A sugestão da criação de uma secretaria de Estado para o acompanhamento do investimento de capital estrangeiro em Portugal foi apenas uma pequena nuance do que o ex-primeiro-ministro parece querer fazer: ingerência nos assuntos do Governo. Por outras palavras, Cavaco quer ser primeiro-ministro outra vez. As pessoas questionam: para que quer Mário Soares, o candidato apoiado pelo PS, ser Presidente da República outra vez, uma terceira vez. Eu pergunto, para que quer Cavaco ser primeiro-ministro (disfarçado de Presidente) outra vez, uma quarta vez?

Mário Soares. O pai da democracia, o pai do PS, um dos pais da entrada de Portugal na União Europeia (à altura Comunidade Económica Europeia), um dos portugueses mais conhecidos e respeitados em todo o mundo. Como todos aqueles que ocuparam posições-chave de poder, Soares também retirou dividendos para si e para os seus amigos (o que é altamente condenável, mas Cavaco fê-lo de igual modo). Soares é acusado disso e, muito mais injustamente, de estar velho e acabado. Não o está. Tem lapsos de memória, confunde coisas, é verdade, mas mantém um raciocínio claro, tem opiniões e sabe pensar sobre o mundo, não tem qualquer cerimónia em dizê-lo, conhece Portugal e grande parte do mundo como a palma das suas mãos, tem uma resistência física impressionante, continua acutilante e mordaz, enfim, está fresquíssimo.

Nesta campanha Soares propôs-se a desmontar o endeusamento de Cavaco, e é o que está a fazer. Não tem de apresentar ideias, porque tem-no feito ao longo de toda a sua vida e carreira. Dele não esperamos surpresas, sabemos ao que vamos. É uma figura histórica e não merece de todo o linchamento público que lhe estão a fazer. Não entendo esta condenação, este ódio quase mortal a Soares.

Não pretendo apelar ao voto num dos candidatos nem no outro, apenas analisar algumas situações e tentar perceber o que se está a passar.

Tal como nas legislativas vamos assistir a um duelo muito desequilibrado. Depois do príncipe Sócrates teremos o rei Cavaco. Afinal continuamos na monarquia e necessitamos assim tanto de salvadores absolutos e iluminados?

China world

Ao sítio onde trabalho chegou no início desta semana uma comitiva de chineses. Mais uma viagem exploratória, de negócios, pensei eu. Esta tarde cruzei-me com um deles nos corredores. Conclusão: trabalham agora aqui, num espaço por excelência dedicado às novas tecnologias e à ciência.

A China confirma então a sua posição como grande potência mundial, não se ficando pelos incontáveis restaurantes low cost fast food que dominam cada esquina das cidades ocidentais, assumindo-se como líder nas áreas de ponta do desenvolvimento tecnológico. É a invasão amarela, como muitos lhes chamam. Esperemos é que seja pacífica. O seu valor acrescentado é bem vindo a Portugal (e ao Ocidente), mas não as condições sub-humanas do seu regime e da sua filosofia quase escravizante de trabalho (que lhes permite o baixíssimo custo de produção).

Faróis do tempo

As lombadas dos livros que enchem as muitas estantes do meu quarto são bilhetes de viagens. Grandes, pequenas, azuis, brancas, amarelas, vermelhas, mais espessas ou mais finas, em português, inglês ou francês, em Arial, Times New Roman ou Comic Sans, mais antigas ou mais recentes, todas elas são símbolos de peregrinações pelo mundo da imaginação e dos sonhos.

Já carimbados pela alfândega e pelo pica, ou ainda não, os bilhetes, quer dizer, as lombadas dos livros, são viagens repletas de personagens novos, histórias mil, enredos e mistérios, reflexões e teorias, trampolins para o irreal, para o que não existe e que é construído na nossa cabeça, fazendo de cada leitura um caso ímpar de escrita criativa.

Cada lombada é um tesouro, cada livro é uma obra de arte, algo precioso que devemos cuidar e amar, que é nosso companheiro de tantas aventuras e que não nos abandona.

A última aquisição de uma das prateleiras consta de exemplares originais de 1906 a 1911 da Ilustração Portugueza (sim, com "z", que na época escrevia-se assim), uma publicação de actualidades nacionais, uma espécie de Visão daquele tempo. São marcos históricos, faróis que permitem vislumbrar melhor o passado, pegadas que nos levam à verdade...

«And when the truth dies very bad things happen."

terça-feira, janeiro 10

By your side

By Your Side

You think I'd leave your side baby

You know me better than that
You think I'd leave you down when you're down on your knees
I wouldn't do that
I'll tell you you're right when you want

And if only you could see into me
Oh when you're coldI'll be there
Hold you tight to me

When you're on the outside baby and you can`t get in
I will show you you're so much better than you know
When you're lost and you're alone and you cant get back again
I will find you darling and I will bring you home

And if you want to cry
I am here to dry your eyes
And in no time You'll be fine

You think I'd leave your side baby
You know me better than that
You think I'd leave you down when you're down on your knees
I wouldn't do that
I'll tell you you're right when you want

And if only you could see into me

Oh when you're cold
I'll be there
Hold you tight to me

When you're low
I'll be there
By your side baby

Oh when you're cold
I'll be there
Hold you tight to me

Oh when you're low
I'll be there
By your side baby

Sade

sexta-feira, janeiro 6

A praia

De todos os cantos do mundo
Amo com um amor mais forte e mais profundo
Aquela praia extasiada e nua,
Onde me uni ao mar, ao vento e à lua

Sophia de Mello Breyner Andersen

terça-feira, janeiro 3

Chorar ou não chorar?

É este mais um dos fossos intransponíveis entre homens e mulheres? Serão as mulheres mais chorosas e sentimentais que os homens? Serão os homens mais frios e duros, mais racionais? Considerarão eles que chorar é fraquejar, é não ser homem, é ser mulher e piegas e tanto criticarem isso nelas? E considerarão elas que chorar é um manifesto de atitude, de verdade, e que ver um homem chorar é sinal de que também ele é humano, que ele a entende e que com ele pode partilhar os momentos mais tristes da vida?

Chorar é um alívio. Com as lágrimas vão-se as tristezas, limpam-se as impurezas que são os obstáculos, saem as pedras que não permitem que o rio corra livremente. Chorar é retemperador, ajuda-nos a reflectir e a relativizar os problemas, cansa-nos fisicamente. E ao cansar o físico passamos automaticamente para ele a preocupação do momento. Controlar a respiração, secar os olhos, ritmar o coração, elimina a acção frenética das células cinzentas que nessa altura insistem em ser vermelhas latejantes.

Há quem se isole para chorar, pegue no carro e percorra estradas sem fim, há quem procure um pedaço de natureza, uma floresta selvagem, um falésia precipitada para o mar, e aí reflicta sobre a vida, há quem faça questão de chorar em frente aos outros, para deles receber o apoio e a atenção que de outra forma não conseguiriam. E há quem procure apenas um abraço amigo, o teu abraço, e no seu ombro, com a cara escondida, deixe as lágrimas verter sem embargo.

Faz-me pensar… Há muito tempo que não choro.

Morte lenta

Morreu Carlos Cáceres Monteiro, ilustre jornalista, analista de referência, histórico da comunicação social. Confesso que me chocou muito o desaparecimento de Cáceres Monteiro. O antigo presidente do Sindicato dos Jornalistas, antigo Director Geral para a Comunicação Social, antigo correspondente da revista espanhola Cambio 16, antigo director do Jornal Sete, co-fundador e director adjunto de O Jornal, vencedor do Prémio Gazeta do Clube de Jornalistas, jornalista do Ano 2002 pelo Clube Português de Imprensa, antigo director da Visão, e até hoje director editorial do grupo Edimpresa (o currículo resumido de um profissional gigante) é um marco para muitos que gostam do jornalismo e que vivem o jornalismo. As suas crónicas à quinta-feira na Visão vão fazer muito falta. Aliás, foi Cáceres Monteiro um dos grandes responsáveis pela referida revista ter hoje a projecção que tem (embora a Visão já tenha vivido melhores dias em termos de qualidade). Os seus comentários na televisão vão ser recordados com saudade, aquele timbre de voz que transbordava sabedoria e conhecimento de causa.

Caio no chavão, sem me importar: o jornalismo português morreu hoje mais um pouco.

segunda-feira, janeiro 2

«É feio!»

Uma colega minha de trabalho contava-me que a filha, ainda pequena, tinha visto o rosto de Cavaco na televisão e dito prontamente: «É feio!».

A verdade fala pela voz das crianças.

A Avenida do Mar

Nos últimos tempos ando a pensar e a relembrar episódios e situações do passado mais longínquo. Deve ser da época, da mudança de ano, que nos deixa mais retrospectivos.

A última memória prende-se com uma casa de praia, que apesar de ser de praia ficava o meio do pinhal. No entanto, em cinco minutos, no final da Avenida do Mar, chegávamos ao dito e à praia. Paraíso na terra. Foi lá que aprendi a andar de bicicleta com a minha tia, foi lá que me ensaiei e aventurei sozinho de carro, que dei os primeiros toques mais a sério com uma raquete de ténis. Lembro-me dos passeios com o Átila, o meu primeiro cão, lembro-me da tosta mista e do sumo de laranja na D. Isaura, lembro-me do primeiro acidente com a bicicleta, que ficou no segredo dos deuses, lembro-me do cheirinho a pinheiros quando chegávamos, da areia pela casa toda no regresso da praia, da pele tostada ao fim do dia… E da família toda reunida, pais, tios e primos.

Tenho de passar por lá, embora aquele ambiente e espírito já viva só na minha memória.