Tigre da Tasmânia

«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector

sexta-feira, janeiro 30

Ridículo e triste

Em lugar de ver qual o dia mais frio do ano ou o maior nevão da época parece que o mundo ocidental anda agora entretido numa estatística mórbida de verificar qual o dia com maor número de despedimentos.

sexta-feira, janeiro 16

Era uma vez

Era uma vez uma princesa que apesar de ter tudo o que alguém pode desejar faltava-lhe algo mais precioso. Um grande amor para o resto da vida. A princesa procurava e procurava e procurava e apesar de conhecer pretendentes perfeitos nenhum deles passava no teste das flores. Nenhum presente deixava a princesa mais contente do que um ramo de flores. Já avisados, todos os rapazes que convidavam a princesa para jantar levavam um ramo de flores. Rosas, orquídeas, margaridas, malmequeres, a princesa já tinha recebido todas flores que há no mundo. Mas todas elas, ao fim de cinco dias, murchavam. A princesa acreditava que o pretendente ideal, o futuro príncipe, seria aquele que lhe oferecesse um ramo de flores que nunca murchasse, pois isso representava o amor que os uniria, e que nunca morreria. Um dia a princesa foi jantar com o conde da praia dourada, que a presenteou com um ramo de jasmim. Ao quinto dia as flores continuam vivas, cheias de cor e de cheiro. Passou o dia 6, o 7, o 8 e o 9. E o 24, e o 35, e 78. Até que a princesa percebeu que a busca tinha chegado ao fim, casou-se com o conde da praia dourada, e viveram felizes para sempre.

domingo, janeiro 11

Uma rosa vermelha

E por entre as pessoas apressadas que subiam as escadas rolantes da estação de metro do Chiado estava uma rosa vermelha na mão de um rapaz. Não era um estudante do conservatório com um estojo de violino, não era um aluno de Belas-Artes com os porta-documentos gigantes, não era uma das muitas velhotas que vivem ainda na zona antiga da cidade e também não era um yuppie de fato às risquinhas verticais. Era um rapaz comum, mas o que importa aqui é a rosa vermelha. Oferecer flores, ou rosas mais concretamente, já parece a muitos, se calhar a cada vez mais, um gesto antiquado, lamechas, parolo mesmo. Será que já ninguém dá rosas vermelhas aqueles de quem gosta?

Parece que sim, que ainda há alguém, e a prová-lo está aquele rapaz comum, igual a tantos outros, que é recebido no topo das escadas pelo beijo ansiado da namorada, com o eléctrico 28 como horizonte.

terça-feira, janeiro 6

Sinais I

Uma sugestão para 2009: visitar www.magneticamagazine.com. O número 2 já está online.

Sinais II

6 de Janeiro. Acaba o Natal. Manda a tradição que se desfaça a árvore. Até 1 de Dezembro.

Sinais III

É mau sinal quando o senhor do centro de emprego já nos cumprimenta na rua.

domingo, janeiro 4

As estátuas

Numa destas noites cada vez mais frias, lá para os lados da igreja grande, uns barulhos estranhos começaram a quebrar o silêncio parado daquela zona. Primeiro tímidos, até podiam ser ramos das árvores a dobrar e a esticar, já que o jardim antigo distava poucos metros dali. Ou até um pássaro desorientado com o nevoeiro que se tivesse perdido pelo meio dos arbustos e das folhas. Mas uma observação mais atenta apontava para a igreja grande. Mas que raio, o mármore antigo estaria a falar? E estava mesmo. As estátuas, as quatro estátuas que adornavam a fachada principal da igreja grande, a Liberdade, a Justiça, a Força e a Aventurança, estavam a emitir sons semelhantes ao crepitar de uma lareira e aos estalidos da madeira de um móvel antigo.

E então começaram a mover-se, julgando que ninguém estava a ver. Primeiro devagar, se calhar para desentorpecer os músculos, depois mais depressa, lá seguiram as quatro, a Liberdade, a Justiça, a Força e a Aventurança, pela estrada abaixo, até desaparecem no horizonte do caminho.

E desde então nunca mais ninguém as viu.