Os últimos grãos da ampulheta
Já falta pouco.
E já que vão ser mais 525.600 segundos, ou 525.601, conforme as perspectivas da coisa, mais vale levar a bem do que a mal.
Até para o ano.
«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector
Já falta pouco.
E se todos os relógios desaparecessem da Terra? Os pulsos ficassem nus, as paredes vazias e os telemóveis sem sinal. Será que podíamos recuperar o tempo? E o tempo que perdemos a encontrar todos os relógios, se é que os podemos encontrar, seria perdido para sempre?
Mamacita, donde esta Santa Claus?
Parecia que estávamos de novo em Buenos Aires. Numa cave com janelas, o ambiente a muito média luz, um piano, mesas e cadeiras de madeira espalhadas pela sala de colunas, rostos vários e roupas coloridas e escuras, novos e velhos, uma senhora matrona que se destacava como as donas dos bordéis antigos, pesadamente instalada no seu trono. E música, acordes de tango que dominavam a sala e todos os ouvidos. Casais que rodopiavam ao som de Gardel, quase sem tocar no chão de pedra. Pernas envolvidas num jogo de sedução e de luta, pescoços inclinados como símbolo de poder e de domínio. Apesar do ambiente de festa e de descontração o tango impunha respeito, como dança maior espírito de uma música maior. Porque os casais que rodopiavam estavam envoltos numa atmosfera de sabedoria e num quase transe, fruto de uma aprendizagem que nós não temos. E assim, respeitadores, abandonámos a cave com janelas a muito média luz e seguimos pela noite fria em busca de outros ambientes.
O pato saíu do lago. Abandonou as águas escuras, o relvado cheio de penas dos outros iguais, e quem sabe dele próprio, saltou por entre as canas e ultrapassou a cerca de ferro pintado de verde. Atreveu-se a atravessar a rua do jardim feita de betão misturado com pedra e brita e lá seguiu. Se calhar atreveu-se porque não sabia sequer o que estava a fazer e nem percebeu que não era suposto fazê-lo. Apenas seguiu o instinto e continuou em frente.
I did my best to notice
Sabe bem sentir-me estrangeiro em Lisboa, ouvindo diálogos de França, Espanha ou Itália, escondido debaixo de um alpendre de heras na Bica. Como se de um filme se tratasse, o som directo e acidental acaba por ser a trama central de um conversa de silêncios.
O livro que me estendeste chamava-se qualquer coisa como «100 regras para ter sucesso» ou algo muito parecido.
Luzes da sala todas acesas, música de época, as caixas todas empilhadas e o espaço livre, dia 1 de Dezembro, já manda a tradição, é dia de fazer a Árvore de Natal.