David Lynch no Metro de Lisboa
Hoje em mais uma viagem de metro (e são duas diárias, dez
semanais), sentei-me ao lado de um senhor que entre sete paragens olhou 14
vezes para o relógio.
Uma porque estava com pressa e
queria mentalmente atrasar os ponteiros.
Duas porque recebeu um relógio
novo no Natal e não se cansava de o admirar.
Três porque tinha receio que
alguém o tivesse roubado.
Quatro porque estava habituado
a ter um relógio digital e tinha ainda dificuldades em acertar nos ponteiros.
Cinco porque os filhos vivem
em São Paulo e queria saber que horas eram lá.
Seis porque disseram-lhe que
aquele relógio era mágico e mudava de cor conforme os humores e ele queria
tirar a prova dos nove.
Sete porque os gatos têm sete
vidas e ele sempre sonhou em ser um gato.
Oito porque me queria
transmitir uma mensagem encriptada como a cena da rosa azul no filme Twin Peaks
do David Lynch (não captei a mensagem).
Nove porque foi picado por uma
melga no pulso e estava a evitar coçar, fazendo-o com a força da mente.
Dez porque é um número
redondo.
Onze porque é o número de uma
equipa de futebol e o senhor é orgulhosamente benfiquista e não perde uma
oportunidade de lembrar-se disso.
Doze porque era o número dos
apóstolos e estamos ainda na altura do Natal.
Treze porque o senhor é de
Montalegre e há o culto da Sexta-feira 13.
Catorze porque o treze é o
número do azar e o senhor lembrou-se de acrescentar para não prejudicar
ninguém.
E no final não captei a mensagem
da Rosa Azul.
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