Tigre da Tasmânia

«Eu escrevo como se fosse salvar a vida de alguém. Provavelmente a minha própria vida» C. Lispector

sábado, outubro 11

Crónicas de Leeds – Dia 2

Continua o frio, claro. E hoje já dá para ver que o céu está muito cinzento, a ameaçar chuva. Welcome to England. Mesmo assim visto-me o mais abrigado que posso, que não é muito porque não contava com um choque térmico tão grande, e meto-me à estrada de ténis calçados. Em duas horas de caminhada as casas não variam muito. Tijolos vermelhos, dois, três andares, janelas grandes para deixarem entrar a pouca luz do exterior. O interessante é que todas as casas têm um jardim, em frente ou nas traseiras, e todos ou quase todos muito bem cuidados. Relva aparada, roseiras podadas, arbustos geométricos, tudo muito bem orientado e montado como se de um puzzle com quatro mil peças correctamente encaixado. A expressão inglesa de lagartos no jardim ao sol (quando o há) parece fazer todo o sentido. Pelos passeios, por contraste com Portugal, quase não há lixo deitado no chão. Talvez por ser uma zona residencial, talvez pelo frio não convidar a estar na rua, a verdade é que é motivo para termos vergonha dos nossos passeios. Mas do lixo que há, a esmagadora maioria são latas de cerveja. A tradição parece que se confirma.

Das raparigas que me cruzo na caminhada, todas elas estão muito pintadas, o que confirma a ideia que tinha das inglesas. Já eles estão quase todos de fato-de-treino, com o seu sotaque quase imperceptível do Norte de Inglaterra. E ao contrário de Portugal, ninguém se olha nos olhos quando se cruza na rua.

Como se sabe os ingleses orgulham-se de serem diferentes do resto da Europa. Tomadas eléctricas diferentes, sentidos de circulação na estrada diferentes, rotundas ao contrário e até os botões de ‘on’ são para baixo e os de ‘off’ para cima. Sendo, para atravessar as ruas, claro que parecia um cata-vento, a olhar a re-olhar várias vezes em todas as direcções. As paragens de autocarro estão bem pensadas, já que a abertura não está virada para a estrada, o que evita que as poças de água da chuva sejam empurradas pelos automóveis para quem espera, mas sim para as casas. E por falar em automóveis, tenho que destacar um autocolante num deles: ‘Dogs are for live, not only for Christmas’.

Como já disse o orgulho inglês nota-se e sente-se a cada momento. Numa altura de ressaca do referendo sobre a independência da Escócia, a cerca de 200 quilómetros a norte de Leeds, aqui e ali vêem-se bandeiras de Inglaterra e do Reino Unido hasteadas em casas e nos carros. Faz lembrar quando Scolari pediu aos portugueses que colocassem bandeiras de Portugal de apoio à Selecção à janela, por altura do Euro 2004 e Mundial 2006. Aliás a questão de orgulho nacional, sempre muito presente em Inglaterra, está casa vez mais acesa. A R. explica-me que o receio do UKIP vencer as eleições e dominar o Reino Unido é cada vez maior, o que constitui uma ameaça para quem não é inglês. Já uns amigos portugueses que no ano passado estiveram no Sul de Inglaterra tinham contado que um dos motivos para não terem cá ficado era esse mesmo, o avanço do UKIP.


São três da tarde, o que para Portugal seria a meio do dia. Mas aqui já caminhamos para o fim. Até amanhã.

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